quarta-feira, 9 de junho de 2010

Ela quase conseguiu


Irmã Erminda. O nome da freira que quase conseguiu me fazer acreditar que era totalmente incapaz de desenhar. Uma das grandes responsáveis pela minha relutância na educação em instituições onde haja freiras e padres. Culpada sim, pelo trauma que me causou durante anos a fio, onde me afastava de tudo o que exigisse lápis, tintas, esboços, mesmo que fosse por pura brincadeira.
A dita cuja Erminda era alta, magra e de nariz empinado. Usava óculos de aros finos de armação metálica dourada. Unhas perfeitamente cortadas e um andar altivo. Lembro dela a partir da 6ª série do Colégio São José do Abranches, onde fiz o antigo ginásio.
A tarefa - Fazer um quadro com gravuras de um cartaz com temas variados, vendidos na própria escola. O modelo escolhido por mim foi bem menininha. Uma garotinha desenhada num campo de flores com baldinhos e outras frescurinhas. Esse "cartaz" tinha que ser colado na moldura de madeira, que por sua vez, deveria ser maior que o tamanho do papel. Com uma técnica crítico-paranóica, cortar com estilete as beiradas do papel restante. Pintar as laterais da moldura e tacar um verniz por cima da gravura.
Tudo foi seguido passo a passo. Porém, houve uma acidente de percurso. Deixei o quadro secando ao sol e a moldura de madeira "empenou". Lógico que fiz o trabalho no dia, lógico que não havia tempo de comprar outro cartaz, lógico que chorei, lógico que minha mãe me acalmou e disse para eu explicar o que havia acontecido.
Na sala de aula, na frente de meus 30 coleguinhas, a Irmã Erminda pegou o quadro, analisou todos os lados e eu explicando timidamente o que havia acontecido, ela se manteve indiferente e PÁ! quebrou o dito cujo ao meio. Falou em alto e bom tom que era o trabalho de Educação Artística mais feio que já tinha visto na vida. Eu, com 11anos de idade quis morrer e como Tommy (da ópera rock), me tornei cega, muda e surda para qualquer manifestação das artes plásticas.
Essa mesma Irmã Erminda me detonou numa escultura em gesso, colocando por conta própria, betume na peça, que ficou parecendo um cocô. E para completar o rol de humilhação, expôs o cocozão na amostra de fim de ano na escola. Todos acreditavam no que aquela mulher de Deus me tornou: um desastre nas artes. "Ela é boa mesmo em Português, Biologia, Inglês, tem letra bonita, é disciplinada, mas falou em desenhar, pintar, esqueça!" - esse era o mantra do inconsciente coletivo.
Isso tudo quer dizer que, passei minha adolescência, juventude e balzaquianismo sem me atrever a desenhar, e quando o fazia, já apresentava as desculpas de não ter jeito para a coisa e a mesma vergonha que passei naquele dia, na sala de aula, com a Irmã Erminda, voltava à tona.
O gelo foi quebrando quando minha sobrinha Manu, com três anos, me pediu para desenhar a Madelaine. A animação passava na TV e no papel comecei a rabiscar. Fico perfeita! E ela vibrou com a tia que sabia desenhar. Nos dias subsequentes foram desenhadas Hello Kittys, Turma da Mônica, Meninas Superpoderosas e uma série de desenhinhos. Foi dada uma pausa. E agora, com minha filha Alice, voltei a desenhar com giz de cera, aquarela, lápis, caneta, mais empolgada que a criança. Meu traço é a mão livre, copiado de um modelo, mas estou começando a me aventurar a fazer os desenhos próprios, minha leitura particular de uma borboleta, flores, bonecas e quem sabe, da Irmã Erminda em gesso!

6 comentários:

  1. Eu tenho problemas com professoras primárias, elas tem um poder imenso! Lembrei de umas duas histórias agora, mas deixo pra contar pessoalmente. Ou postar uma delas no meu blog, hummm!

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  2. Eu tive experiências horríveis no primário e no ginásio, todas com esse tipo de professora caga-regra. Olha que eu era muito boa desenhista, até pensei em fazer Belas Artes em vez de Jornalismo, mas uma professora de Educação Artística me disse que eu era "muito clássica e sem-graça" porque quando mandava desenhar as árvores da escola, eu copiava neuroticamente cada pedaço de galho e folha, com desenhos quase fotográficos. Ok, pode ser cafona, mas é meu, né? Bjk.

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  3. Cacete! É por essas e por outras que agradeço por nunca ter estudado em escola de freiras ou algo parecido! Minha prima comia o pão q o diabo amassou nas mãos dessas virgens de jesus, só que era com aquelas toalhas de mesa (imensas!) de bordar.
    Enfim! Parabéns pela redescoberta de um dom! É sempre legal isso, aqui em casa a desenhista é minha irmã mais nova, leva jeito a bichinha. Bjs! =D

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  4. Olha, como criatura criada em colégio de freiras tive muitos, muitos problemas com elas. Marilena era o nome daquela que foi a mais odiada na minha infância. Sim, parece heresia, mas eu odiei a freira com todas as minhas forças. E fiz o possível para destruir a reputação dela perante a turma. Professora de quê era a criatura? Português! Mas a história conto no blog um dia desses. Ainda tenho problemas com os pinguins de saias. E nunca consegui desenhar como adulta. Só desenhos bem infantis. Isadora desenha melhor que eu.

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  5. Anos mais tarde, como assessora de imprensa de um grande grupo educacional de Curitiba, promovi um concurso de "Melhor Desenho" para a revista das escolas. Foi um sucesso a participação, mas me deparei com um problema na hora de "julgar" os trabalhados. Então, uma professora de Artes me explicou, que na pedagogia moderna, não se aplica avaliação de nota para trabalhos artísticos, mas sim, conceitos, porque hoje se respeita a leitura individual, principalmente a de uma criança. A sugestão foi de que, com todos os trabalhos enviados ao concurso se fizesse um mural, expondo todas as "obras". E assim foi feito. E assim todos foram felizes para sempre!

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